Numa recente entrevista à revista Der Spiegel, a chanceler Merkel perguntava-se: como é que a UE estará em condições de continuar a representar 50% da despesa social do planeta, quando contém apenas 7% da população e algo entre 20% e 25% do PIB mundial? As multidões que no Brasil protestam contra a opulência das obras de fachada (como as que ajudaram a arruinar Portugal), ou os jovens de Istambul que querem liberdade para as suas vidas, e os milhões de chineses que todos os dias combatem para não terem de escolher entre o salário e a miséria ambiental, também devem ser chamados a responder à pergunta de Merkel. Não é uma desgraça pequena que a mais poderosa personalidade política europeia olhe para o nosso complexo presente com a argúcia de um capataz paroquial. O "Estado social" europeu não foi uma oferta, mas uma conquista de milhões de mulheres e homens ao longo de dois séculos de lutas sociais. Se a Europa ainda suscita admiração, foi por esta ter sido capaz de combinar economia de mercado com justiça social, numa óptica distributiva, baseada em direitos humanos e não numa caridade facultativa. A saúde do "Estado social" não se resolverá com uma certidão de óbito, mas com a sua refundação numa base de economia ecológica, acentuando a distribuição da riqueza.
Com mais políticas públicas, e não com menos. Com mais cooperação internacional, e não com uma corrida para o abismo que levará, pelo menos, ao proteccionismo. A chanceler esqueceu-se de referir que, também na Europa, mesmo antes da crise, se tem assistido a uma enorme concentração do rendimento no 1 % da população mais rica.
Não se trata apenas de uma crise de crescimento, mas de uma captura do sistema político pela oligarquia económica. O problema é conhecido. E a solução também.
VIRIATO SOROMENHO-MARQUES, Professor universitário
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