Historicando

Historicando
historicando@gmail.com

12 julho 2013

A esfinge de Belém

Basta verificar a miríade de comentários ao discurso do Presidente da República para compreender que ontem aconteceu algo que ficará para a história: a Esfinge de Tebas mudou-se para Belém, e durante a noite milhões de portugueses (e algumas centenas de analistas e jornalistas internacionais) revolveram-se nas suas camas, tentando rivalizar com Édipo na decifração dos enigmas deixados pelo supremo magistrado da Nação. Há discursos políticos que ficaram para a história pela firmeza ética (o de Lincoln, no campo de batalha de Gettysburg, em 1863), pela coragem da verdade (o de Churchill, ao mostrar o rosto sangrento de uma guerra necessária, em 1940), pela determinação cortante (o de Salazar, dando ordem de marcha para Angola, em 1961). Mas o actual inquilino do Palácio das Leoneiras inaugurou um género único: o da charada política. Não sabemos quanto tempo é que o Governo "em funções" vai demorar a decompor-se, aos bocadinhos, ou em bloco. Nem quando é que os "mercados" vão perceber que em Lisboa se trocou uma "crise política" que poderia resolver-se já em Setembro, por um interregno que promete arrastar-se até Junho de 2014, pelo menos. O custo de errar na decifração do enigma da Esfinge de Tebas era a morte. A Esfinge de Belém também aqui é original.
Não sabemos o preço a pagar por um discurso que empurrou o País para dentro da viscosidade de um poço de crude. Mas uma coisa é certa, a Esfinge de Belém matou, de um golpe, a esperança dos portugueses, alicerçada na Constituição, de ter na Presidência um estadista capaz de, acima do tropel das facções, assumir, com clareza e sem ambiguidade, a escolha de um caminho.
VIRIATO SOROMENHO-MARQUES, Professor universitário
http://www.clipquick.com/Files/Imprensa/2013/07-12/0/5_2073568_AE326DD3A999FB5721DA3D3A56394DD0.pdf