Historicando

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27 maio 2013

A ALTA

Na primavera de 2012 tive o privilégio de ter sido convidado para almoçar com o senhor Presidente da República. Durante a conversa que antecedeu o almoço fui por ele questionado sobre como via eu a economia portuguesa no final do período de resgate. Ao que eu lhe respondi: "Qual resgate, senhor Presidente? O primeiro ou o segundo?"
Sorrindo, respondeu-me: "Está a ser provocador..."
Já na altura senti que o colossal esforço que nos impunham e o resultado que antevia não eram compatíveis com uma saída fácil e rápida da situação de resgate, embora o desejasse, como continuo a desejar, ardentemente.
Além do objectivo inicial do resgate de transformar a economia portuguesa numa economia mais internacionalizada, mais aberta à iniciativa e ao investimento não-residente, era objectivo inicial obrigar um rápido ajustamento da dimensão do Estado e do seu défice orçamental, de modo a deixar o país em condições de poder manter essa posição e, assim, reganhando a confiança do mercado internacional, recuperar a soberania e a independência financeira.
E o que é que se passou? Infelizmente o défice teima em não se reconciliar com o que era inicialmente esperado, a ponto de levar a um inevitável reescalonamento de metas e prazos. E mesmo tendo em conta o extraordinário e polémico exercício da redução da despesa, a (in)esperada descida de alguma receita, acompanhada de uma subida do custo da dívida no orçamento leva-nos a captar cada vez mais impostos só para pagar juros.
A economia afunda-se cada vez mais, o investimento nacional é uma miragem, o internacional não dispara, as exportações estão agora e cada vez mais a darem sérios indícios de preocupação e a dívida acumula-se. Apesar disto, os juros para a dívida pública, para grande assombro meu, têm mantido uma trajectória de constante descida. O BCE propõe-se comprar grandes quantidades de dívida pública de maturidades até aos três anos dos Estados cumpridores, mas os diferenciais das taxas de acordo com os prazos não parecem indicar que o mercado esteja a distinguir esta barreira de maturidades decretada pelo BCE.
Com uma economia mais debilitada, com um orçamento longe do equilíbrio no curto e no longo prazo, com um peso crescente do serviço da dívida e com indicadores económicos como o da última estimativa do INE para a evolução do PIB a mergulharem numa queda histórica de -3,9% face a 2012, como e em que condições iremos aos mercados financiar-nos?
A troika pode sair porque o FMI desiste do paciente, mas pelo menos a 'doika', parece-me, que terá de ficar... Para nos manter a soro comatoso. É improvável termos 'alta' neste estado.
E se a tivermos, o mais provável será um reinternamento em curto espaço de tempo.
João Duque, jduque@iseg.utl.pt
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