Fumava, é verdade, mas acabou-se! O problema está no stress laboral e familiar!
Por volta de meados de Fevereiro comecei a sentir-me mal, cansava-me com extrema facilidade. Para dar uma ideia, uma simples caminhada de 100 metros deixava-me completamente exausto, com falta de ar, a transpirar abundantemente. Arrastava os pés ao caminhar. Cheguei a sentar-me em qualquer lado, dado o pânico que sentia – num muro, até no lancil das estradas.
Depois vieram as pontadas agudas nas costas. Pareciam punhais a espetar-me. Onde estivesse parava, não me mexia, e até tinha medo de respirar tal a sensação de desconforto e de que se enchesse o peito de ar, o coração rebentaria.
Apesar da doença absoluta e permanentemente incapacitante para o trabalho, o sentido de honra profissional levou-me a que fizesse as matrizes, tabela de cotações, e corrigisse, pontuasse e classificasse duas turmas de História, com 26 e 22 alunos, e cada teste tinha 20 questões. Corrigi ainda os testes de Português de Expressão Escrita e de Compreensão Oral de 26 alunos. Após isso, há que fazer o lançamento em grelhas Excel apropriadas. Horas e horas que só quem é da arte sabe o que custam… E não são contabilizadas nas 35 horas semanais da F.P. nem tão pouco pagas como extraordinárias, ou compensadas seja lá de que maneira pensarem.
Por fim chegou a fase aguda, insuportável. As dores no peito, enormes, indescritíveis, sufocantes, que se estendiam por todo o tronco e braços. 20 minutos de terror.
Tive um enfarte no dia 3 de Março, de manhã. Como estava em pânico consegui chamar a minha filha que me trouxe às Urgências do H.L.A. por volta das 11 horas. Fui visto na triagem e mais tarde por uma médica que me disse que o meu mal era tabaco! Atendeu-me, sem se levantar, aí uns 120 segundos. Não mediu a tensão arterial, não auscultou. Disse com base em observação ocular à distância: o seu mal é tabaco! Passe bem, boa tarde. Eram 14.30 horas. Fui para casa “descansadíssimo”…
Dia 4 de Março dei aulas da parte da manhã, isto é, das 8.30 às 12.45 horas. Fui a casa almoçar, como sempre, e voltei à escola perto das 14.30, hora a que recomeçaria o turno da tarde. Tive um ataque fulminante, uma dor incontável. Não consegui subir ao 1º piso onde iria leccionar. Dirigi-me, arrastando-me, ao órgão directivo, e disse-lhes que estava a sentir-me extremamente mal, com uma dor fortíssima no peito e braços. Exudava abundantemente, não me conseguia aguentar de pé, tive de sentar-me, tinha dificuldade em articular palavras com fluência. Trouxeram um 1º aparelho para medir a tensão arterial. Não funcionava. Trouxeram um 2º aparelho: deu 18 – 12 !! Estava rodeado por inúmeras pessoas, adultas, com cargos de responsabilidade, experientes, e ninguém chamou o 112 – INEM. Há uma frase que não me esquecerei, ainda para mais repetida duas vezes: “és um homem, ou um rato?”O Sr. Director ofereceu-se para me trazer ao hospital. Acabou por ser a minha filha a transportar-me do meu local de trabalho ao hospital. Consequência: como não vim de ambulância, apesar do enfarte, estive das 15 horas até às 19 horas para ser visto por um médico. Felizmente que o médico acreditou no que lhe disse (homem calmo, ponderado, africano), e mandou de imediato fazer uma serie de exames. Às 21 h. chamou-me e disse-me que precisava de conferenciar com outros colegas de Medicina Interna. Esperei mais uma vez na sala de espera. Fui chamado por um médico de ascendência do Leste, que analisou os resultados e remeteu a resolução para um 3º médico, espanhol, conciso, sisudo, proficiente, que mandou repetir todos os exames iniciais que efectuara. São 24 h. quando este competente médico, Dr. José António Quiles, me diz de forma directa, desassombrada, olhos nos olhos, que tinha tido dois enfartes do miocárdio agudos, um na 5ª e outro na 6ª feira, e se queria viver tinha de ficar internado de imediato na Urgência – SO. Dei entrada às 00.15 h. de dia 5 de Março. Ainda estou internado no H.L.A.
Comprimidos já tomei centenas. “Picas” para recolha de sangue dezenas. Estou monitorizado de hora a hora, é para a glicemia, para a hipertensão, para a “espessura” do sangue, para o colesterol, sei lá que mais…
Dia 9 de Março fui levado de ambulância ao Hospital Santa Maria em Lisboa, para fazer um cataterismo. O acto médico correu bem, embora me tenha doido imenso a injecção das linhas guias e do líquido contrastante. O pior foi as notícias na sala de recobro após o cataterismo: tenho de fazer uma operação de coração aberto, com corte do esterno, para desobstruir três artérias entupidas e rectificar a aorta superior. Então é assim, explicado pelo médico que me fez o cataterismo : uma artéria está obstruída a 100%; uma segunda a 92%; a terceira acima dos 50%; a quarta está limpa, desimpedida. Isto é, a função de grande e de pequena circulação do sangue, no meu caso, faz-se por uns meros 40% de capacidade necessária. Quanto a mexer na artéria aorta o caso ainda é mais bicudo. O médico limitou-se a dizer que vai correr tudo bem. Ah já me esquecia de dizer que vão fazer-me uns by-passes com veias tiradas dos pés.
Aguado a data da operação. A espera é angustiante. Estou na ala de enfermaria de Medicina A.
Sei que vou ser injusto, mas peço desculpa antecipada, porque não sei ou não me lembro dos nomes de todos os que me protegeram, trataram, cuidaram. Ainda assim aqui deixo registo de alguns: Drs. Sousa e Costa, Pedro Marques, Armindo Ribeiro, Rui Costa, J. Paulo Caixinha, e Dras. Susana Feitas, e Sofia Silva. Agradeço ainda o apoio dos Drs. Loução, João Campos, e Edgar.
E que dizer nos inúmeros profissionais de enfermagem (excelentes) que comigo interagiram? Só tenho uma expressão: muito obrigado, “kanimambo”, extensivo ao pessoal auxiliar de vários serviços.
Hospital do Litoral Alentejano |